domingo, 23 de junho de 2013

Marcha Brasileira em Boston

Texto publicado na Bate Papo Magazine, edição 80.

23/06/2013 - Harvard Square, Cambridge/MA, EUA

Pronto, agora sou mais sou que foi pra rua e se decepcionou com o que viu... Fui lá depois de ter acompanhado uma troca de informações muito interessantes e produtivas sobre o movimento em Boston de apoio às manifestações Brasileiras - através do grupo criado no Facebook para divulgar a manifestação - e, chegando lá, no meio de cartazes interessantes com os pedidos já "clássicos" de "chega", "basta", também tinha muita coisa interessante com pontos específicos como reforma política, contra pec 37, contra a "cura gay", porém o grito mais forte era "fora Dilma" e até "fora comunistas". "FORA COMUNISTAS"?????? Triste. O povo teoricamente "não aguenta mais corrupção" mas pelo jeito ainda está muito longe de saber como mudar... Protesto de manchete. Muita frase de efeito mas pouco conteúdo e muita falta de informação. Não aguentamos, voltamos tristes. Ou alguém acha melhor ter o Temer ou o Calheiros como presidente? Pois é, saindo a Dilma, a cadeia sucessória é esta. Melhora ou piora? Se não gostas - e tens todo direito democrático de não gostar- espera 2014 e muda no voto que é melhor.

Não basta querer mudar, há de se saber como fazê-lo. E, para isto, há de se entender como funciona o sistema político Brasileiro. No nosso presidencialismo parlamentarista, o(a) Presidente não é imperador. Não é ele que decide tudo e todos, muito pelo contrário. Boa parte das decisões sobre o rumo do país são decididas na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, cabendo ao(à) Presidente o veto parcial sobre eles, bem como edição de medidas provisórias e uma série de Leis específicas. PECs (proposta de emenda constitucional) por exemplo, não pode ser apresentada pela Presidência, embora muito tenha se visto pelos movimentos Brasil afora pedidos endereçados à Presidente Dilma que vetasse esta ou aquela PEC, poder que não lhe cabe. "Ah, mas ela pode fazer pressão".

Pode, mas não deve. Por quê? Na minha opinião justamente para que seja preservada a fundamental independência entre os poderes.

Enquanto pensarmos somente nos Prefeitos, Governadores e Presidentes, esquecendo que quem Legisla são os vereadores, deputados estaduais, federais e senadores, este quadro de infidelidade partidária, troca de favores, conchavos dos mais inacreditáveis, bancadas regidas sob a batuta de conglomerados econômicos (sejam eles de construtoras, madeireiras, agricultores/pecuaristas) ou até mesmo religiosos (que de uns tempos para cá tem apresentado mais e mais projetos que visam a tornar Lei certos princípios da sua religião, em detrimento da liberdade religiosa da nação, do princípio básico de respeito à religião alheia - ou até ausência dela - e da laicidade do Estado, fazendo com que toda a população seja obrigada a viver sob os mesmos dogmas particulares desta ou daquela religião), vai persistir.

O tão famoso "mensalão", por exemplo, escândalo super badalado e super dimensionado pelo principal veículo de mídia do país, não é invenção do governo atual. É prática recorrente para que o governo de momento possa ter uma base mínima que lhe "permita" aprovar um conjunto mínimo de projetos que considere fundamental para o plano de governo. É troca de favores do mais absurdo. Não estou querendo defender nem isentar o governo atual, apenas lembrar que isto é recorrente e consequência da "promiscuidade política" do legislativo (deputados e senadores), que trocam seus princípios(?) ideológicos por favores pessoais. Sem o qual, por mais absurdo que possa parecer, o governo não consiga aprovar sequer projetos que até a oposição acredita ser benéfica para a população/economia do país.

Quantas vezes já não se viu a oposição de ontem sendo contra um projeto do governo de hoje que ela mesma apresentou quando foi governo? E vice-versa, i.e., o governo de hoje tendo vetado proposta similar quando era oposição.

Ah, mas então o(a) Presidente não tem culpa de nada? Também tem, pois também tem suas responsabilidades, mas não pode ser o alvo isolado de um problema que vai muito além da Presidência, estando muito mais ligado ao Legislativo (Câmara e Senado) do que ao Executivo (Presidência).

O "Gigante Acordou"? Sinceramente? Não sei. Como aqueles slogans de sociedades de apoio, acredito que foi dado o primeiro passo: o "gigante" finalmente reconheceu que existe um problema que precisa ser corrigido. Mas me parece ainda estar longe dos passos seguintes que é identificar com clareza o problema e sua origem e, então, lidar com ele e valer-se dos mecanismos possíveis para solucioná-lo. Mas, ao menos, o primeiro passo foi dado.

Obs.1: cheguei com minha esposa e meu filho perto do horário marcado e não aguentamos ficar muito tempo, fomos embora antes das 16h porque chegamos a conclusão que não era o que imaginávamos e por não concordarmos com o rumo que estava tomando. Enfim, a manifestação, na prática, também não nos representava... Posteriormente ouvimos relatos que nos levaram a crer que depois das 16:30 chegou uma "segunda leva" de manifestantes que teoricamente tinham maior profundidade política, mas não posso atestar pois não estava presente.

Obs.2: fiquei curioso em saber quantos dos que lá gritavam "fora Rede Globo" assinam o pacote da Globo Internacional no seu serviço de TV...

Obs.3: também ficamos curiosos em saber quantos dos que ali estavam, teoricamente querendo melhorar o Brasil, estão dispostos a voltar para lá e tomar atitudes concretas para isto ou, como já escutamos, só voltarão "quando o Brasil mudar"? O Brasil que queremos, cabe a nós construirmos. E o Brasil está mudando, mas precisa mudar mais, e precisa de todos para isto. Não que não possam não querer voltar ou que não possam querer que o país melhore sem tomar parte neste processo, mas é de se pensar, ou não?